Genética e o problema do racismo na sociedade

O racismo tem sua gênese na forma de pensamento que teoriza a respeito da divisão de seres humanos em “raças”. A partir dessa separação, é preconizada a superioridade de uns, em detrimento de outros, acarretando assim atitudes preconceituosas e discriminatórias. Essa ideia de raça que permeia entre os seres favorece a concepção do racismo como uma modalidade de dominação, ou, a exemplo da época da escravidão, como uma maneira de justificar a dominação de um grupo sobre o outro, baseada nas diferenças fenotípicas da nossa espécie. Na referida época, vale ressaltar, existiam institutos jurídicos que legitimavam tal atitude, até que veio à tona o processo abolicionista trazendo leis que buscasse dar à pessoa humana dignidade e direitos, acentuando, desde já, a importância do Direito na luta contra racismo.

Não há dúvidas de que o racismo em nossa sociedade é um problema extremamente urgente que precisa ser combatido. Mas, para isso, é preciso compreender o que é o racismo, que muitas vezes é confundido com injúria racial. A injúria racial está prevista no nosso Código Penal, e, de acordo com ele, injuriar é ofender a dignidade ou o decoro utilizando elementos de raça, cor, etnia, religião, origem ou condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência. Comumente, o crime de injúria está diretamente ligado ao uso de palavras depreciativas referentes à raça ou cor cujo objetivo é ofender a honra da vítima. De outra parte, o crime de racismo resulta de conduta discriminatória dirigida a determinado grupo. A lei (que mencionaremos mais a frente) enquadra diversas situações como crime de racismo. Um por exemplo de situação é recusar ou impedir o acesso de uma pessoa a um estabelecimento qualquer usando como motivo, por exemplo, a cor da pele, entre outras situações dispostas na lei. Não obstante, o mesmo empenho que é preciso para combater o racismo deve ser empregado no combate à injúria racial, uma vez que ambos são crimes que geram consequências muitas vezes irreparáveis para quem sofre, e tais consequências podem chegar ao extremo de uma vida ceifada. É aí que enxergamos a importância do antirracismo e as possibilidades que o Direito nos traz de ser um grande aliado nessa luta.

Nessa perspectiva, muito se ouve uma frase que diz: “em uma sociedade racista, não basta não ser racista, é necessário ser antirracista”. E ser antirracista é compreender que ninguém nasce racista assim como ninguém nasce antirracista, tanto um como o outro são fruto de escolhas que fazemos. Ser antirracista resulta de uma decisão consciente que cabe a todos nós de agir de forma consistente e equitativa. E essa mudança de comportamento exige autoconsciência e autorreflexão contínuas ao longo da vida, uma vez que a luta contra o racismo é responsabilidade de todos. Cabe a nós, enquanto sociedade, fazer a nossa parte e tornamo-nos ativos na compreensão, entendimento e estudo sobre raça, racismo, preconceito, discriminação, ações que podem acabar com as desigualdades raciais, aplicação e fiscalização da legislação nos crimes que forem cometidos, ou seja, ser verdadeiramente atuante para que assim, em um futuro próximo, possamos mudar o cenário. A partir do momento que internalizarmos que o racismo é um problema de todos, e todos temos um papel fundamental a desempenhar para detê-lo, e que o Direito sozinho não é capaz de vencer essa luta, teremos então um cenário de mais humanidade.

Por que o racismo não é crime?

A despeito da nossa legislação, observamos que na história brasileira, o racismo não era tipificado como crime, e, como dito anteriormente, tal prática era tida como normal, natural, legitimada. Sendo assim, percebemos que, no que tange o Direito nos âmbitos da Criminologia e do Direito Penal, houve um grande avanço da legislação antirracista brasileira embasada em princípios constitucionais (é notório a evolução dos direitos e garantias fundamentais nas últimas décadas por conta da Constituição Cidadã), quando da tipificação dos crimes de injúria racial e racismo. Além da nossa Constituição Federal, que imputou ao crime de racismo a condição de ser inafiançável e imprescritível destacando a preocupação que o legislador tinha em repudiar e evitar tais condutas tendo em vista que o Estado poderá punir o agente responsável em qualquer tempo. Embora a Constituição seja o instrumento normativo de maior relevância, existem no nosso ordenamento jurídico, outros dispositivos que buscam resguardar os interesses da vítima, dos quais, atribui-se importância especial à Lei n° 7.716/89, que define os crimes resultantes do preconceito de raça e de cor, e, posteriormente, a lei passou a punir também os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de etnia, religião ou procedência nacional.

Por tudo isso, é possível concluir que as normas antirracismo presentes no ordenamento jurídico brasileiro são rígidas e capazes de repreender quem pratica tal crime, e que tanto a CF/88 quanto as leis infraconstitucionais oferecem importante contribuição no processo de combate ao racismo e à promoção da igualdade racial. Um exemplo claro da evolução legislativa no combate ao racismo é a tipificação dos crimes de ‘injúria racial’ e de ‘racismo’. É fato que temos todo um arcabouço jurídico capaz de combater o racismo, mas é fato também que pouco se houve acerca da punição de seus agentes. Prova disso acontece quando buscamos decisões jurisprudenciais sobre a aplicação da lei 7.716/89, ao realizarmos tal pesquisa encontraremos um número irrisório de decisões levando em consideração a quantidade de casos que tomamos conhecimento diariamente. É claro que devemos considerar aqueles que não buscam a justiça, ainda assim, o número de decisões é pequeno.

Diante disso, aspiramos que com o passar do tempo, a lei 7.716/89 venha a ser aplicada de maneira mais efetiva punindo e condenando os responsáveis por tais práticas. Graças ao momento que vive o país, no qual se discute muito o debate sobre o racismo, verifica-se um aumento no registro de queixas. Nessa vertente, percebemos então a importância do engajamento da sociedade como um todo, entendendo que a luta contra racismo deve envolver a todos. Enquanto não avançarmos nessas pautas que parecem dizer respeito somente a quem sofre tais atos, não vamos transformar a sociedade brasileira. Ser antirracista é justamente sobre isso, sobre uma transformação profunda da nossa sociedade, tarefa de todo o povo brasileiro.

Racismo e injúria racial no ordenamento jurídico | Luciana Maria de Freitas

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